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Editorial: Ataque ao Rondoniaovivo revela o quanto é perigoso ser jornalista no país.

O Brasil se compara ao Iraque e ao México em relação a mortes e ameaças a repórteres. A insegurança e o medo na prática jornalística é prejudicial à democracia.

 

Por Henrique Terceiro

Na madrugada do dia 25 de abril, uma pessoa avistou fumaça saindo de uma vã e acionou os bombeiros. A van era uma Unidade Móvel do jornal Rondoniaovivo, um dos mais populares da região na internet. O portal faz muitas reportagens de campo, cobrindo a violência e o crime na região, com diversos repórteres atuando em Rondônia. O interior da vã foi queimado com gasolina, mas não haviam passageiros. Há de se suspeitar que foi um ato de intimidação ao jornal. Dias antes do atentado, como relatado pelo próprio Rondoniaovivo, uma janela da redação do site foi quebrada à pedrada.

 

A polícia ainda não identificou quem perpetrou tais atos, mas não parece ser um caso de vandalismo desprendido. Geralmente, quando o alvo é um veículo de jornalismo, não é.

 

A imprensa sempre foi alvo de interesses dos poderosos. É comumente chamado de o “quarto poder”, capaz de eleger e derrubar políticos, criar heróis e vilões. Por isso os poderosos sempre tentam manter sua influência sobre os meios de comunicação – empresários por meio de financiamento; políticos por meio de corrupção; e quando a pessoa tem contatos com o crime organizado, ameaças, sequestros e assassinatos a membros de uma linha editorial esteja investigando casos comprometedores.

 

Desde 2002, o Brasil caiu 50 posições no ranking que mesura a liberdade de imprensa em diversos países. Promovido pela Repórteres sem Fronteiras, uma organização internacional que advoga pela liberdade de informação e proteção de repórteres. Ficamos em 104º lugar numa classificação contendo 180 países em 2016. Uma queda de 5 posições desde 2015, causado sobretudo pela instabilidade política, instigada pela própria mídia, que culminou no impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Pela avaliação da entidade, os interesses políticos deterioraram a qualidade jornalística, descumprindo com os princípios de isenção e imparcialidade na maioria dos editoriais. Mas no caso do Brasil há um agravante: o crime organizado, a violência nas cidades e em manifestações torna a profissão do repórter muitas vezes uma atividade de risco.

 

Atacados por todos os lados

 

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Giuliana Vallone, repórter da Folha de S. Paulo baleada com arma de borracha por um PM em 2013 (Foto: Folha)

Repórteres de campo são os que mais se arriscam para buscar a notícia, entrevistando, tirando fotos e vídeos em tempo real. Nas chamadas jornadas de julho de 2013 os atentados contra a integridade física de repórteres e manifestantes chocou o país de modo que os editoriais dos principais jornais passou de um lado conservador – condenando as manifestações – para um apoio completo. A polícia é instruída a tratar repórteres e cinegrafistas de modo privilegiado, afinal eles estão no fogo cruzado apenas fazendo o seu trabalho. Isso não impediu que a repórter da Folha de S. Paulo Giuliana Vallone fosse atingida no olho por uma bala de borracha ficando cega para sempre, em uma manifestação contra as tarifas de ônibus na capital paulista. “Jamais achei que ele fosse atirar”, comentou Giuliana.

 

No lado dos manifestantes, os mais radicais, que utilizavam táticas Black Bloc também fizeram vítimas. Em fevereiro de 2014, o cinegrafista Santiago Andrade da TV Bandeirantes foi atingido por um rojão na cabeça, morrendo de morte cerebral. O incidente causou revolta na mídia que resultou até na prisão polêmica de 23 manifestantes suspeitos, incluindo a estudante conhecida como “Sininho”.

 

Que Medellín não seja aqui.

 

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Pablo Escobar

O Cartel de Medellín, que aterrorizou a Colômbia no fim dos anos 1980, voltou a receber atenção do mundo todo com a série Narcos, do Netflix. A história do magnata Pablo Escobar, encenado pelo brasileiro Wagner Moura, seus capangas e agentes da DEA (a polícia anti-drogas dos Estados Unidos), tem personagens secundários que não apareceram na TV: as dezenas de repórteres, jornalistas e colunistas que morreram ou perderam parentes pelo crime organizado por tentar fazer cobertura de seus crimes. A muitos editoriais foram fechados, circulando quase na clandestinidade, como foi o caso do El Espectador, um jornal local que tradicionalmente atacava o tráfico de drogas. Nenhum locador queria ceder imóvel para o jornal, depois que um ataque à bomba destruiu a gráfica do periódico em 1987. Chegou-se a um ponto em que todos passaram a praticar uma auto-censura semelhante a existente em regimes ditatoriais: ninguém queria estar na mira do cartel de Medellín. Alguns colunistas se mudaram para Miami para continuar trabalhando sem perseguições.

A pressão foi tanta que alguns editores cediam à pauta do grupo criminoso. Muitas manchetes sugeriam que a maneira mais rápida de acabar com o caos instaurado pela violência era com a revogação dos tratados de extradição que estavam sendo negociados entre os governos da Colômbia e dos Estados Unidos. Este era o maior medo de Pablo Escobar e seus comparças, já que numa prisão americana sua influência para obter benefícios seria quase nula, podendo amargar a vida inteira na prisão. Numa visão superficial, a atitude desses editores é imoral e contra o interesse público, mas é compreensível considerando o intento de proteger seus empregados e pares. De fato, o poder e influência local de Escobar era tão grande que ele chegou à política como suplente no congresso colombiano a pedido do candidato à presidência Luis Carlos Galán.

Rondônia pode não ter chegado numa situação tão escancarada. O crime organizado não é tão poderoso aqui como em Medellín ou no Rio; mas as ameaças e atentados contra profissionais da mídia é constante, especialmente no interior. Ano passado, o jornalista Ivan Pereira da Costa levou dois tiros numa tentativa de homicídio em Cujubim, no interior de Rondônia – acredita ele que devido aos crimes que ele publicava em seu site de notícias. Depois de sobreviver ao atentado, Ivan fechou o seu site e decidiu se mudar de Cujubim. Associação dos Jornais Eletrônicos de Rondônia (Arjore) e a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) divulgaram notas de repúdio pelo atentado ao jornalista. A Arjore classificou o episódio como “ato cruel e covarde” e protocolou dois pedidos oficiais na Polícia Civil e Militar, pedindo maior empenho nas investigações sobre o atentado.

 

Solidariedade para os profissionais da imprensa.

O jornal Na Hora Online representado pelo diretor Carlos Terceiro de Medeiros e jornalista Henrique MartinsTerceiro repudiam o atentado ocorrido no dia 25 contra o Rondoniaovivo, de propriedade do empresário e profissional de imprensa Paulo Andreoli. Exigimos das autoridades que investiguem e apurem o ocorrido, e que a sociedade partilhe dessa indignação. Um atentado contra um profissional ou veículo de comunicação é um atentado à própria prática da imprensa, cujo livre exercício é indispensável para o funcionamento da democracia, informando os cidadãos sem medo.

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