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Professor Nazareno, o colunista mais polêmico do Norte, escreve: “Mataram o rio Madeira”

A íntegra da coluna redigida por Professor Nazareno

A íntegra da coluna redigida por Professor Nazareno

Há quase 43 anos quando passava pela primeira vez em Porto Velho, eu fiquei admirado com a grande exuberância do rio Madeira. Era o longínquo mês de janeiro de 1981 e perguntei a um senhor se eu podia atravessar aquele magnífico rio a pé. Ele sorriu e disse que era impossível, pois havia uma profundidade muito grande. Algo em torno de 20 metros ou mais no caudaloso canal. Além do mais, disse o homem, há muitos bichos que devoram um ser humano em questão de minutos. O tempo passou e a minha pergunta pode ter uma outra resposta hoje. O velho Madeira perdeu o encanto de outrora e diminui cada vez mais ano após ano. A seca inclemente na região em 2023 associada a um calor insuportável que beira os 40 graus à sombra parece que querem o fim irremediável do décimo oitavo maior rio do mundo. Lula: “não é normal o que acontece no rio Madeira”.

Secaram o Madeira. E todos vamos pagar por isso. Em seu leito construíram duas grandes hidrelétricas e hoje é a tosca mão humana que determina repiquetes, enchentes e vazantes. O rio Madeira não tem mais madeiras e praticamente nasce em Porto Velho, logo a jusante da hidrelétrica de Santo Antônio. Sem forças, agonizante e debilitado pela ambição do homem, o rio também deixou de ser piscoso. Os poucos e raros peixes que ainda teimam em nadar em busca da piracema perderam o rumo com os paredões que impuseram ao seu habitat natural. Quem não se lembra dos famosos festivais de pesca na extinta cachoeira do Teotônio? Ali sim, era peixe aos montes! Cansei de pegar peixe no tapa. No verão, ao pé das corredeiras era fácil ser pescador. Era curimatá, surubim, pacu, sardinha, pescada, mandi e infinitas outras espécies que matavam a fome de muita gente.

O rio Madeira está hoje com apenas um metro e trinta centímetros de água. Se não chover pra valer a partir de outubro próximo, vai secar ainda mais e a travessia nele “sem molhar os pés”, que antes era impossível, vai se tornar uma realidade. Até as embarcações de pequeno porte têm restrição para navegar em seu leito seco, cheio de pedras e bancos de areia. A navegação noturna foi proibida. Vilarejos como São Carlos, Nazaré e Calama têm dificuldade de acesso. O rio Madeira já está morto. As hidrelétricas em seu curso condenaram-no à extinção. E as dragas do garimpo ilegal extraindo ouro em seu leito cambaleante e removendo areia completaram o serviço. Provavelmente o velho Madeira nem canal tem mais. Ali está tudo revirado, mexido, destruído. Assorearam o maior rio dos rondonienses. Os poucos peixes que ainda existem estão contaminados pelo mercúrio.

E quem ganhou com as hidrelétricas? Certamente não foram os “trouxas” dos rondonienses. Aqueles que gritavam de peito estufado no início deste século: “queremos hidrelétricas, já!”. Quanto se paga hoje para ter energia elétrica em Porto Velho? Não é pouca coisa, não. E nestes meses de verão o consumo aumenta exponencialmente. Grande parte da produção energética das hidrelétricas rondonienses vai para o Sistema Interligado Nacional. Rondônia deixou que estuprassem a sua natureza e em troca paga uma das tarifas de energia elétrica mais caras do país. O Estado hoje praticamente está até sem aeroporto, pois os poucos voos regulares que havia foram quase todos retirados sem maiores explicações. Rondônia deu o que tinha para o Brasil e nada recebeu em troca. E a classe política local, rica, pouco ou nada faz. Com essa seca severa no Madeira, até o abastecimento de combustível pode ficar comprometido. Por aqui só falta chover merda.

*Foi Professor em Porto Velho.

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